por samokal, em 13.02.08
Casamos novos. Ela com 19 e eu com 20 anos de idade.
Lua-de-mel, viagens, mobílias na casa alugada, prestações da casa própria e
o primeiro bebê.
Anos oitenta e a moda era ter uma filmadora do Paraguai. Sempre tinha um
vizinho ou amigo contrabandista disposto a trazer aquela muambazinha por um
preço módico.
Ela tinha vergonha, mas eu desejava eternizar aquele momento. Invadi a sala
de parto com a câmera no ombro e chorei enquanto filmava o parto do meu
primeiro filho. Todo mundo que chegava lá em casa era obrigado a assistir ao
filme.
Perdi a conta das cópias que fiz do parto e distribuí entre amigos, parentes
e parentes dos amigos. Meu filho e minha esposa eram os meus orgulhos.
Três anos depois, novo parto, nova filmagem, nova crise de choro.
Como ela categoricamente disse que não queria que eu filmasse, invadi a sala
de parto mais uma vez com a câmera ao ombro . As pessoas que me conhecem
sabem que havia apenas amor de pai e marido naquele ato. O fato de fazer
diversas cópias da fita era apenas uma demonstração de meu orgulho.
Nada que se comparasse ao fato de ela, essa semana, invadir a sala do meu
urologista, câmera ao ombro, filmando o meu exame de próstata. Eu lá, com as
pernas naquelas malditas perneiras, o cara com um dedo (ele jura que era só
um!) quase na minha garganta e minha mulher gritando:
- Ah! Doutoor! Que maravilha! Vou fazer duas mil cópias dessa fita! Semana
que vem estou enviando uma para o senhor!
Meus olhos saindo da órbita a fuzilaram, mas a dor era tanta que não
conseguia falar. O miserável do médico girou o dedo e eu vi o teto a dois
centímetros do meu nariz. A mulher continuou a gritar, como um diretor de
cinema:
- Isso, doutor! Agora gire de novo, mais devagar. Vou dar um close agora...
Alcancei um sapato no chão e joguei na maldita.
Agora, estou escrevendo este e-mail, pedindo aos amigos que receberem uma
cópia do filme, que o enviem de volta para mim. Eu pago o reembolso.
(Luiz Fernando Veríssimo)
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